Artigo/Renata Amaral:Semicondutores e China no foco da estratégia de segurança nacional dos EUA

Artigo/Renata Amaral:Semicondutores e China no foco da estratégia de segurança nacional dos EUA

Por Renata Amaral*

Washington, 21/10/2022 – Outubro tem sido, provavelmente, um mês agitado na China. Para além da reunião do Partido Comunista chinês nesta semana para aprovação do novo plano quinquenal e eleição do Presidente, os EUA colocaram em prática neste mês uma nova política de controle de exportações desenhada especialmente para atacar o país asiático.

Tolerância zero para semicondutores

Há poucos dias, em 7 de outubro de 2022, em um movimento que foi saudado por altos funcionários do governo dos EUA como uma mudança de paradigma na política de controles de exportação dos EUA para a China, o Bureau of Industry and Security (BIS) do Departamento de Comércio emitiu uma regra final provisória que altera os Regulamentos de Administração de Exportação (EAR).

A alteração dos regulamentos administrados pelo BIS visa impor controles novos e expandidos sobre circuitos integrados de computação avançada, produtos de computador que contêm tais circuitos integrados, e certos itens de fabricação de semicondutores. As transações para uso final de supercomputadores e transações envolvendo certas entidades estão agora sujeitas a controles adicionais de exportação, assim como certos itens de fabricação de semicondutores e transações para determinados usos finais de circuitos integrados.

Adicionalmente, as movimentações das pessoas dos EUA no que se referem a certas atividades de semicondutores na China também são agora restritas. As metas políticas dos EUA por trás das novas regras são ambiciosas e buscam degradar a indústria de computação avançada da China de forma sem precedentes.
As amplas implicações dessas novas regras, juntamente com sua eficácia do ponto de vista político, podem levar algum tempo para serem plenamente implementadas. Por enquanto, está claro que qualquer cidadão ou entidade, americana ou não, que desempenhem qualquer papel na cadeia de fornecimento global de semicondutores – seja como fabricantes, produtores, consumidores ou de outra forma – precisam rever cuidadosamente as novas regras para determinar o que é necessário para cumprir e, se necessário, buscar orientação ou uma licença do BIS.

As novas regras estabelecem controles unilaterais dos EUA exclusivamente para a China. São controles extraterritoriais em grande parte, no sentido de que eles se aplicam fora dos Estados Unidos até mesmo a itens de origem estrangeira se utilizarem ferramentas ou tecnologia dos EUA.

A partir de 12 de outubro de 2022 passou a ser uma exigência de que as pessoas dos EUA (seja uma empresa, um indivíduo ou alguém agindo em seu nome), caso estejam fornecendo suporte em termos de embarque, transmissão, facilitação ou manutenção de itens de fabricação estrangeira em uma instalação que produz semicondutores são agora controlados. Seja um cidadão individual trabalhando no exterior para uma empresa estrangeira, ou uma empresa dos EUA e seus agentes estrangeiros trabalhando no exterior, a partir dessa data passou a ser controlado e exige uma licença.

Os regulamentos emitidos pelo Departamento de Comércio são, sem dúvida, uma nova e imensa barreira na forma de controles de exportação que impedirão a China de comprar os semicondutores mais avançados do Ocidente ou equipamentos para fabricá-los por conta própria.

Estratégia de Segurança Nacional Biden-Harris

Para escancarar o foco do atual governo em combater a China, no mesmo 12 de outubro de 2022, a Casa Branca divulgou a Estratégia de Segurança Nacional Biden-Harris. O documento descreve como os Estados Unidos avançarão em seus interesses vitais para um mundo “livre, aberto, próspero e seguro”.

A apresentação de um documento Estratégia de Segurança Nacional não é novidade. Na verdade a apresentação desse documento encontra fundamento na Lei de Segurança Nacional aprovada pelo Congresso norte-americano em 1947, que determina que o Presidente entregue um abrangente “relatório anual de estratégia de segurança nacional”.

O que se espera de uma Estratégia de Segurança Nacional pela Casa Branca é uma linguagem mobilizadora para implementar uma grande estratégia de governo e explicar por que os interesses e instrumentos dos EUA são legítimos. Atualmente há uma tensão considerável sobre se a grande estratégia dos EUA priorizará a concorrência entre nações autocráticas e democráticas, ou se o governo Biden buscará ampla cooperação em desafios globais, como mudanças climáticas e pandemias, por exemplo.

De acordo com o documento apresentado na última semana, os EUA utilizarão de todos os elementos de poder nacional para superar seus concorrentes estratégicos; enfrentar desafios compartilhados; e modificar regras que precisem ser modificadas. A nova estratégia norte-americana tem como pilares os seus interesses nacionais: proteger a segurança do povo americano, expandir a oportunidade econômica, e defender os valores democráticos do povo norte-americano.

Em termos de segurança estratégica, os EUA nunca deixaram tão claro o interesse em combater a China, seu maior rival no (des)equilíbrio geopolítico de poder global. Efetivamente, o documento declara que os EUA competirão frontalmente com a China, que é o único competidor com a intenção e, cada vez mais, a capacidade de remodelar a ordem internacional, ao mesmo tempo em que restringe os perigos provocados pela Rússia.

Liderança global em jogo

Uma informação que fica clara no desenho da nova estratégia norte-americana de segurança nacional e com os novos regulamentos que afetam diretamente a indústria de semicondutores é a necessidade de colocar os Estados Unidos novamente na liderança global e competir com grandes potências autocráticas – com foco na China – para remoldar a ordem internacional. É um sentimento com amplo apoio bipartidário, inclusive.

Os formuladores de políticas dos EUA parecem determinados a reduzir a interdependência econômica dos dois países, construída ao longo de muitas décadas, mas agora se curvando sob o peso de crise entre os dois países. O mesmo acontece com os formuladores de políticas econômicas na China.

Até agora, a dissociação econômica que acontece é em parte o resultado da guerra comercial do presidente Trump, bem como da continuação de muitas dessas políticas sob o governo Biden. Biden, inclusive, dobrou a aposta das medidas implementadas pelo seu antecessor. E isso pega bem aqui nos EUA.

* Renata Amaral é Advogada, Consultora Sênior em Comércio Global e Doutora em Comércio Internacional. Está baseada em Washington/DC e é Professora do Washington College of Law, da American University. Escreve quinzenalmente para o Broadcast.

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